Avenida Paulista completa 125 anos
Carlos Eduardo Entini e Liz Batista
08/12/2016 | 11h28   
Símbolo de São Paulo já teve outro nome, chamou-se Carlos de Campos, mas o nome não pegou
Avenida Paulista, entre 1896 e 1900. Guilherme Gaensly/Reprodução Acervo Light
Hoje seria impensável chamar por outro nome a avenida símbolo de São Paulo, mas a Avenida Paulista, que hoje completa 125 anos, já foi Avenida Carlos de Campos. Não carregou o nome por muito tempo, foram apenas três anos, mas a mudança esconde um importante processo de troca de poder na história de São Paulo e do Brasil.
O Estado de S.Paulo - 8/12/1891
Inauguração. A avenida foi entregue oficialmente ao público no dia 8 de dezembro de 1891, com o início do tráfego de bondes. "Ao meio-dia a Companhia Ferro Carril fará a inauguração de suas linhas da Bella Vista e da Bella Cintra (..) que percorrerão toda a Grande Avenida Paulista", dizia a notinha publicada na primeira página do Estado.
Segundo o livro Cidade de São Paulo: Estudos de Geografia Urbana, 1958, a via inicialmente seria chamada de Avenida das Acácias, ou Prado de São Paulo. Mas Eugênio de Lima decidiu por Avenida Paulista em homenagem ao povo que tão bem o acolhera.
Durante três anos, o endereço do Parque do Trianon foi Avenida Carlos de Campos. Estado 15/7/1927
Em 1927 uma lei decretou que a Avenida Paulista passaria a se chamar Avenida Carlos de Campos. Era uma homenagem ao ex-presidente do Estado, morto naquele ano. Em 1930, um ato administrativo, de outro prefeito, desfez o primeiro. Numa canetada tudo voltou a ser como era antes, “a Avenida Carlos de Campos volta a denominar-se Avenida Paulista”.
A mudança do nome pode parecer uma singela honraria a um ex-governante, mas por trás dela está um movimento de ascensão e queda de grupos políticos que lideraram as revoluções de 1924 e de 1930. Carlos de Campos era chefe do governo de São Paulo quando explodiu a Revolução de 24, movimento que combatia as oligarquias políticas – ele era um dos alvos.
Decreto do prefeito João Pires do Rio
Campos comandou a resistência e autorizou o bombardeio aéreo contra a capital para desentocar os revoltados. São Paulo foi a única cidade a sofrer um ataque aéreo na história do Brasil. Leia mais sobre o movimento que deixou mais de 500 mortos e parte da cidade destruída aqui.
Desfile dos batalhões da Força Pública, sob o comando do General Miguel Costa, diante do Belvedere na Avenida Paulista, 5/11/1930. Acervo/ Estadão
Em 1930, quando os derrotados de 1924 chegaram ao poder, também chegava a hora de rever a história. Isso ficou claro no Ato que mudou os nomes de diversas ruas, “devem ficar gravados nas ruas e nas praças da cidade como já o estão no coração dos brasileiros, os nomes dos grandes homens que foram sacrificados durante a lucta que acaba de encerrar-se”.
Atualmente a cidade vive processos semelhantes. Projeto de lei da Prefeitura prevê alterar o nome de ruas, pontes, praças e viadutos relacionados à ditadura militar. Dessa forma o elevado Costa e Silva, um dos presidentes do período da ditadura militares, passou a se chamar Minhocão, como sempre foi chamado pelos paulistanos.
De qualquer forma, a troca por decreto em 1927 não foi aceita por todos paulistanos. A prova são os diversos anúncios publicados no Estado na época, ora avenida era chamada pelo nome original, ora pelo novo.
Hoje, Carlos de Campos dá nome à principal avenida do bairro do Pari. Ironicamente uma das regiões mais atingidas pelos bombardeios de 1924.
Agora acompanhe os detalhes dessa história.
De Avenida Paulista para Carlos de Campos. Em 20 maio de 1927 a lei aprovada pela Câmara Municipal de São Paulo entra em vigor alterando o nome da Avenida Paulista para Avenida Carlos de Campos. A mudança no nome foi uma homenagem póstuma ao presidente do Estado de São Paulo, morto em 27 de abril daquele ano. Membro do oligárquico Partido Republicano Paulista (PRP) e natural da cidade de Campinas.
Carlos de Campos era filho de um dos fundadores da tradicional legenda, o ex-presidente do Estado, Bernardino de Campos. Foi líder da bancada paulista na Câmara Federal até chegar ao Governo em maio de 1924. Sua morte repentina, quando estava em pleno exercício do cargo, gerou grande comoção. Além do funeral público com altas honras, manifestações de pesar correram o Estado.
Nome forte do PRP, não demorou até que aparecesse uma proposta de honraria à sua memória. Na Câmara, o vereador Marcondes Filho explicou porque achava que a mudança de nome da Paulista era uma homenagem justa: “tratando-se de uma via pública cujo nome recorda todos os paulistas, na sua generalidade, tinha-se a impressão de que a alma encantadora dessa avenida aguardada, com esse nome tão generalizado, o momento oportuno para batizar-se com o nome do paulista que mais se soubesse merecer de seu povo”, disse.
Figura indissociável da história da Revolução de 1924, Carlos de Campos ocupava a chefia do governo paulista há pouco mais de um mês quando a Revolução Paulista eclodiu, em 5 de junho de 1924. O levante tenentista- que pretendia derrubar o presidente Artur Bernardes, pedia o fim do domínio político das oligarquias a adoção do voto secreto- deixou marcas em São Paulo. O confronto tomou as ruas da capital. Os rebeldes tenentistas bombardearam o Palácio dos Campos Elísios, residência oficial do presidente do Estado.
Carlos de Campos então refugiou-se, junto com a família, no interior, enquanto as forças leais ao governo lançavam bombardeios aéreos contra a cidade para destruir as bases e refúgios tenentistas. A revolta terminou em 28 de julho e deixou um saldo de cerca de 500 mortos, na sua maioria civis.
De Avenida Carlos de Campos para Paulista. Quando a Revolução de 1930, apoiada pelos membros dos movimentos tenentistas, derrubou o presidente Washington Luís e a República Velha, a elite política paulista perdeu poder e autonomia. Getúlio Vargas, que agora ocupava a Presidência da República como chefe do Governo Provisório, consolidou-se no poder nomeando para cargos políticos do novo governo muitos tenentistas, figuras que haviam sido chave para o sucesso da revolução.
Em outubro de 1930 a nova cadeia de comando havia nomeado José Joaquim Cardoso de Melo Neto o novo prefeito de São Paulo. Uma de suas primeiras medidas foi adotar novas denominações para vias públicas. Alguns lugares, como o Largo do Palácio que passou a ser denominado Praça João Pessoas e a rua Fontes Júnior que foi renomeada rua Joaquim Távora, foram rebatizados para homenagear os revolucionários de 1930 e os heróis tenentistas. A Avenida Paulista, então Avenida Carlos de Campos, retornou ao seu nome original.
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Vista aérea da Avenida Paulista e seus arredores, na região central de São Paulo, 19/5/1983. Acervo/ Estadão
O ato N. 11, publicado no Diário Oficial de 13 de novembro daquele ano, e assinado pelo prefeito Cardoso de Mello, nomeado pelo interventor, além de determinar que as vias deveriam apenas ser batizadas com nomes de pessoas falecidas, também oficializou o retorno ao nome Paulista. “Attendendo , finalmente, a que outras denominações a, que não deveriam jamais ter sido alteradas como a da Avenida Paulista que recorda, numa só palavra, todo o indefesso trabalho e honra da gente paulista”, diz o ato.
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